terça-feira, 24 de julho de 2012

Cavalos e Baias


Há duas formas de se domar um cavalo. A primeira, e mais comum, leva semanas, e consiste em surrar o animal para que ele aprenda quem manda. A segunda, que pouca gente conhece, leva, no máximo, meia hora, e se dá pela conquista do animal pelo seu domador. Como numa dança delicada entre amantes, homem e cavalo se olham devagar, aos poucos, medindo de alto a baixo o que cada um tem a oferecer, até que, finalmente, a mão do homem desliza suavemente sobre a testa de seu animal. Disso sabem poucos, mas, mesmo sem conhecer essa delicada técnica de sedução, bailam cotidianamente em busca da mão que vai mudar sua vida.

É essa dança de frenética busca que marca a plasticidade do espetáculo Cavalos e baias, com silêncios perturbadores e ruídos delirantes. A atenção se divide entre os corpos esguios que enchem o palco e as palavras que, como se nada fossem, seduzem o espectador no fundo de cena. O cotidiano, com seu tecido feito de aprisionamentos e libertações tão sucessivos quanto paradoxais, vai-se desconstruindo à medida que os movimentos de cena quebram as barreiras das baias que querem, à força, e todos os dias, nos conter.

Alegoria primorosa da passividade do homem ante o cercado que o cerceia, Cavalos e baias revela a possibilidade de quebrar o alambrado, pular a cerca, relinchar, respirar, viver. Dessa coloração febril que compõe a liberdade faz-se o espetáculo, e aprendemos, mais uma vez, que a arte pode sempre ser nossa via de libertação.


- Cláudia Capello é Doutora em Literatura Comparada, professora da UERJ e coordenadora pedagógica do FGV online.

Nenhum comentário:

Postar um comentário