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terça-feira, 24 de abril de 2012

Para o Rafa e o Gunnar



para os momentos de caminhar na lua.
para o rosto do rafa,
salvo de qualquer estado.
para os braços do gunnar,
erguidos em bandeira e agonia.

paira.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Para uma avenca partindo

- Olha, antes do ônibus partir eu tenho uma porção de coisas pra te dizer, dessas  coisas assim que não se dizem costumeiramente, sabe, dessas coisas tão difíceis de serem ditas que geralmente ficam caladas, porque nunca se sabe nem como serão ditas nem como serão ouvidas, compreende? olha, falta muito pouco tempo e se eu não te disser agora talvez não diga nunca mais, porque tanto eu como você sentiremos uma falta enorme de todas essas coisas, e se elas não chegarem a ser ditas nem eu nem você nos sentiremos satisfeitos com tudo que existimos, porque elas não foram existidas completamente , entende, porque as vivemos apenas naquela dimensão em que é permitido viver, não, não é isso que eu quero dizer, não existe uma dimensão permitida e uma outra proibida, indevassável, não me entenda mal, mas é que a gente tem tanto medo de penetrar naquilo que não sabe se terá coragem de viver, no mais fundo, eu quero dizer, é isso mesmo, você está acompanhando o meu raciocínio? falava do mais fundo, desse que existe em você, em mim, em todos esses outros com suas malas, suas bolsas, suas maçãs, não, não sei por que todo mundo compra maçãs antes de viajar, nunca tinha pensado nisso, por favor, não me interrompa, realmente não sei, existem coisas que a gente ainda não pensou, que a gente talvez nunca pense, eu, por exemplo, nunca pensei que houvesse alguma coisa a dizer além de tudo o que já foi dito, ou melhor, pensei sim, não, pensar propriamente não, mas eu sabia, é verdade que eu sabia, que havia uma outra coisa atrás e além de nossas mãos dadas, dos nossos corpos nus, eu dentro de você, e mesmo atrás dos silêncios, aqueles silêncios saciados, quando a gente descobria alguma coisa pequena para observar, um fio de luz coado pela janela, um latido de cão no meio da noite, você sabe que eu não falaria dessas coisas se não tivesse a certeza de que você sentia o mesmo que eu a respeito dos fios de luz, dos latidos dos cães, é, eu não falaria, uma vez eu disse que a nossa diferença fundamental é que você era capaz apenas de viver as superfícies, enquanto eu era capaz de ir ao mais fundo, de não sentir medo desse mais fundo, você riu porque eu dizia que não era cantando desvairadamente até ficar rouca que você ia conseguir saber alguma coisa a respeito de si própria, mas sabe, você tinha razão em rir daquele jeito porque eu também não tinha me dado conta de que enquanto ia dizendo aquelas coisas eu também cantava desvairadamente até ficar rouco, o que quero dizer é que nós dois cantamos desvairadamente até agora sem nos darmos contas, é por isso que eu estou tão rouco assim, não, não é dessa coisa da garganta que falo, é de uma outra coisa, de dentro, entende? por favor, não ria dessa maneira nem fique consultando o seu relógio o tempo todo, não é preciso, deixa eu te dizer antes que o ônibus parta que você cresceu em mim dum jeito completamente insuspeitado, assim como se você fosse apenas uma semente e eu plantasse você esperando ver nascer uma plantinha qualquer, pequena, rala, uma avenca, talvez, samambaia, no máximo uma roseira, é, não estou sendo agressivo não, esperava de você apenas coisas assim, avenca, samambaia, roseira, mas nunca, em nenhum momento essa coisa enorme que me obrigou a abrir todas as janelas, e depois as portas, e pouco a pouco derrubar todas as paredes e arrancar o telhado para que você crescesse livremente, você não cresceria se eu a mantivesse presa num pequeno vaso, eu compreendi a tempo que você precisava de muito espaço, claro, claro que eu compro uma revista pra você, eu sei, é bom ler durante a viagem, embora eu prefira ficar olhando pela janela e pensando coisas, estas mesmas coisas que eu estou tentando dizer a você sem conseguir, por favor, me ajuda, senão vai ser muito tarde, daqui a pouco não vai ser mais possível, e se eu não disser tudo não poderei nem dizer nem fazer mais nada, é preciso que a gente tente de todas as maneiras, é o que estou fazendo, sim, esta é a minha última tentativa, olha, é bom você pegar sua passagem, porque você sempre perde tudo nessa bolsa, não sei como é que você consegue, é bom você ficar com ela na mão para evitar qualquer atraso, sim, é bom evitar os atrasos, mas agora escuta: eu queria te dizer uma porção de coisas, de uma porção de noites, ou tardes, ou manhãs, não importa a cor, é, a cor, o tempo é só uma questão de cor, não é? pois isso não importa, eu queria era te dizer dessas vezes em que eu te deixava e depois saía sozinho, pensando numa porção de coisas que queria te dizer,  pensando também nas coisas que eu não ia te dizer, porque existem coisas terríveis que precisam ser ditas, não faça essa cara de espanto, elas são realmente terríveis, eu me perguntava se você era capaz de ouvir, se você teria, não sei, disponibilidade suficiente para ouvir, sim, era preciso estar disponível para ouvi-las, disponível em relação a quê? não sei, não me interrompa agora que eu estou quase conseguindo, disponível só, não é uma palavra bonita? sabe, eu me perguntava até que ponto você era aquilo que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você, eu queria saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu sentia, e se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas essas coisas que me fascinavam e que no fundo, sempre no fundo, talvez nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só conseguir ver, e desamar era não mais conseguir ver, entende? Dolorido-colorido, estou repetindo devagar para que você possa compreender, melhor, claro que dou um cigarro pra você, não, ainda não, faltam uns cinco minutos, eu sei que não devia fumar tanto, é, eu sei que os meus dentes estão ficando escuros, e essa tosse intolerável, você acha mesmo a minha tosse intolerável? eu estava dizendo, o que é mesmo que eu estava dizendo? ah: sabe, entre duas pessoas essas coisas sempre devem ser ditas, o fato de você achar minha tosse intolerável, por exemplo, eu poderia me aprofundar nisso e concluir  que você não gosta de mim o suficiente, porque se você gostasse, gostaria também da minha tosse, dos meus dentes escuros, mas não aprofundando não concluo nada, fico só querendo te dizer de como eu te esperava quando a gente marcava qualquer coisa, de como eu olhava o relógio e andava de lá pra cá sem pensar definidamente em nada, mas não, não é isso, eu ainda queria chegar mais perto daquilo que está lá no centro e que um dia destes eu descobri existindo, porque eu nem supunha que existisse, acho que foi o fato de você partir que me fez descobrir tantas coisas, espera um pouco, eu vou te dizer de todas essas coisas, é por isso que eu estou falando, fecha a revista, por favor, olha, se você não prestar muita atenção você não vai conseguir entender nada, sei, sei, eu também gosto muito do Peter Fonda, mas isso agora não tem nenhuma importância, é fundamental que você escute todas as palavas, todas, e não fique tentando descobrir sentidos ocultos por trás do que eu estou dizendo, sim, eu reconheço que muitas vezes falei por metáforas, e que é chatíssimo falar por metáforas, pelo menos pra quem ouve, e depois, você sabe, eu sempre tive essa preocupação idiota de dizer apenas coisas que não ferissem, está bem, eu espero aqui do lado da janela, é melhor mesmo você subir, continuamos conversando enquanto o ônibus não sai, espera, as maçãs ficam comigo, é muito importante, vou dizer tudo numa só frase, você vai............................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................ sim, sei, eu vou escrever, não, eu não vou escrever, mas é bom você botar um casaco, está esfriando tanto, depois, na estrada, olha, antes do ônibus partir eu quero te dizer uma porção de coisas, será que vai dar tempo? escuta, não fecha a janela, está tudo definido aqui dentro, é só uma coisa, espera um pouco mais, depois você arruma as malas e as bolsas, fica tranquila, esse velho não vai incomodar você, olha, eu ainda não disse tudo, e a culpa é única e exclusivamente sua, por que você fica sempre me interrompendo e me fazendo suspeitar que você não passa mesmo duma simples avenca? Eu preciso de muito silêncio e de muita concentração para dizer todas as coisas que eu tinha pra te dizer, olha, antes de você ir embora eu quero te dizer quê. 

Caio Fernando Abreu

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Se puderem, perguntem ao pó:


Uma contribuição para Cacá e Gunnar. Ao meu ver, bons caminhos para o desdobramento da relação já iniciada no diálogo de "Uma linda mulher". Possíveis brechas, possíveis encontros e desencontros. Gosto, especialmente, dos diálogos curtos e do fluxo de pensamento da personagem masculina. Gosto, também e ainda mais, da forma como a personagem se coloca em relação ao corpo da Camilla e a maneira sexual e instigante de como a descreve.


AQUI:

Uma noite, atendi a uma batida na porta e lá estava ela.

- Camilla!

Entrou e sentou-se na cama, com algo debaixo do braço, um maço de papéis. Olhou para o meu quarto: então era aqui que eu vivia. Ela se perguntara sobre o local onde eu morava. Levantou-se e caminhou, olhando pela janela, dando voltas no quarto, bela garota, Camilla, cabelos escuros cálidos, e eu fiquei de pé e a observei. Mas por que viera? Sentiu minha pergunta, sentou-se na cama e sorriu para mim.

- Arturo - falou. - Por que brigamos o tempo todo?

Eu não sabia. Falei algo sobre temperamentos, mas ela sacudiu a cabeça e cruzou os joelhos, e uma sensação de suas belas coxas sendo alçadas ficou marcada na minha mente, uma sensação densa e sufocante, desejo  quente e luxuriante de tomá-las em minhas mãos. Cada movimento que ela fazia, o suave giro do pescoço, os grandes seios inflando-se debaixo do guarda-pó, as belas mãos sobre a cama, os dedos estendidos. Estas coisas me perturbavam, um peso doce e dolorido me arrastando para um estupor. Então o som de sua voz, contido, sugerindo zombaria, uma voz que falava ao meu sangue e aos meus ossos. Lembrei-me da paz daquelas últimas semanas, parecera tão irreal, fora um hipnotismo que eu mesmo criara, porque isto era estar vivo, estar olhando para os olhos negros de Camilla, confrontando seu desdém com esperança e uma lascívia descarada.

(...)

- Como vão todos os seus outros namorados? - falei. 

Disse aquilo sem pensar. Me arrependi na hora. Amaciei com um sorriso. Os cantos de sua boca reagiram, mas com um esforço.

- Não tenho namorados - disse.

- Claro - falei, com uma leve pincelada de sarcasmo. Claro, eu entendo. Perdoe-me um comentário irrefletido.
Ficou silenciosa por um tempo. Fingi que estava assobiando. Então ela falou:

- Por que é tão mesquinho?

- Mesquinho? - falei. - Minha querida garota, sou tão amigo de homem quanto de besta. Não há uma gota de inimizade no meu mundo. Afinal, você não pode ser mesquinho e um grande escritor. Seus olhos caçoaram de mim.

- Você é um grande escritor?

- É uma coisa que você jamais vai saber.

(...)

- Olá - disse.

- Olá, estúpida - respondi.

- Trabalhando?

- O que acha? - falei.

- Zangado? - disse.

- Não, apenas desgostoso.

- Comigo?

- Naturalmente - eu disse.

(...)

- Com medo? - disse ela.

- De você? - eu ri.

- Está com medo - disse ela.

- Não, não estou.

Abriu os braços e toda ela parecia aberta para mim, mas aquilo só
me fez fechar-me ainda mais, levando comigo a imagem dela naquela
ocasião, como estava viçosa e macia.

- Veja - falei. - Estou ocupado. 

- Está com medo também.

- Do quê?

- De mim.

- Imagine...

Silêncio.

- Há algo errado com você - ela disse.

- O quê?

- Você é veado.

Levantei-me e fiquei de pé ao lado dela.

- É mentira - disse.


* Fragmentos de "Pergunte ao pó" de John Fante. Ed. José Olympio, 2011, 10 edição.
* Uma contribuição de Otávio Borba.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Um diálogo.



Cacá e Gunnar. Gostaria que vocês dois pudessem aprofundar a tímida relação que foi apresentada no sistema. Me interesso muito por este diálogo que tirei do vídeo e colo aqui para vocês. O Be gostou muito daquela relação e pensa em momentos de abuso e disputa de força entre vocês dois. Masculino X feminino, poder... e por aí vai.

Vamos tentar?

No vídeo de 2:32 até 4:37.

segue:


Ela: No que está pensando sentado aqui sozinho?

Ele: É a nossa última noite juntos e, finalmente, vai ser livrar de mim.

Ela: É... foi duro conviver com você.

Ele: Meu negócio está quase terminado e eu tenho que voltar para NY. Gostaria muito de vê-la de novo.

Ela:  Gostaria?

Ele: Sim. Sim, gostaria. Já aluguei um apartamento pra você. Você vai ter um carro e vai ter também muitas lojas que vão bajular você a qualquer hora que for fazer compras. Está tudo pronto.

Ela: E o que mais? Vai deixar algum dinheiro na cama quando passar pela cidade?

Ele: (Vivian) realmente não seria assim.

Ela: E como seria?

Ele: Bom, por um lado não estaria mais nas ruas. 

Ela: Isso é pura geografia.

Ele: (Vivian) o que você quer? O que acha que está havendo entre a gente?

Ela: Eu não sei... Quando eu era uma garotinha minha mãe costumava me trancar no sótão quando eu era levada e eu era sempre. E, então, eu fingia que era uma princesa presa numa torre por uma rainha malvada e, de repente, um cavaleiro num cavalo branco com todas aquelas cores brilhantes aparecia na minha janela e levantava a espada...e eu acenava....e ele subia na torre...e me salvava. Mas nunca em todo tempo que eu tinha esse sonho o cavaleiro me dizia: "vem benzinho, eu vou botar você num belo apê"

fim.