sexta-feira, 30 de março de 2012

Ordem não linear

Ordem Não Linear

Solidão Saudade Saudade
Abandono Distância Solidão

VENCEDOR
Saudade
Saudade
DOR

Fracasso Acaso Falência SOLIDÃO
PERDA exposição ausência


Vazio
Perda
Dor
Fracasso
Dor
FRACASSO
Falência
Dor
Distância
Corpo
Casal
Convívio
Carência
Desespero

ACASO.DOR.QUEBRA.RELAÇÃO.
CASAL.

DINHEIRO... DINHEIRO... DINHEIRO...
DESESPERO
DOR
COMPETIÇÃO PODER DINHEIRO

DINHEIRO PODER


TÁTIL
DISPUTA TÁTIL
ENCONTRO TÁTIL
DOMINAÇÃO TÁTIL

PODER CONSTRUÇÃO

PODER DOMINAÇÃO

OBSESSÃO
TÁTIL
DISPUTA
DISTÂNCIA
SAUDADE
DOR.

Tentativa Linear e Não.

Dominação: Lavagem-puxada de cabelos-namorados-
Casal: pino-lavagem-porrada-namorados-rolamento
Poder: puxada brusca pelo pé-lavagem-banda
Relação: porrada-puxada de cabelo-namorados-
Desespero: mov. Fred- cinderela-correr em círculos
Ausência: mov fred-pino
Exposição: pino-cinderela-porrada
Obsessão: mov.fred-porrada-dancinha rafa-cinderela
Tátil: lavagem-touro
Competição: briga de cabeças-trotes
Fracasso: mov fred-queda brusca
Perda: partitura austrália
Solidão: dancinha rafa-árvore
Vazio: mov fred-árvore-cinderela
Convívio: porrada
Distância: pino-árvore-partitura austrália
Carência: rolamento
Disputa: briga de cabeças-porrada
Falência: trote de quatro-correr em círculos
Ascensão: touro
Dor: mov Fred-puxada de cabelo
Vencedor: touro
Quebra: banda- puxada brusca-touro
Abandono: dancinha rafa
Acaso: salto no outro-banda
Encontro: banda
Construção: lavagem
Saudade: árvore
Corpo:trotes

Não linear:

Corpo-Vazio
Quebra-Desespero
Dominação-Abandono
Construção-Fracasso
Disputa
Solidão-Acaso
Dinheiro
Ascensão-Encontro
Exposição
Distância
Casal
Perda-Convívio
Carência-Competição
Falência
Relação
Ausência
Obsessão-Dor
Poder
Vencedor-Saudade

Pele solta sobre o músculo

"Foi na fonte que o primeiro homem encontrou a primeira mulher. Ela estava apanhando água quando o homem, arrogante, aproximou-se dela e pediu de beber. Mas ela havia chegado primeiro e ela também estava com sede. Descontente, o homem a empurrou. Ela deu um passo em falso e caiu por terra. Então o homem viu as coxas da mulher, que eram diferentes das suas. E ficou paralisado de espanto. A mulher, mais astuciosa, ensinou-lhe muitas coisas: 'Deita-te,' disse ela, 'e eu te direi para que servem teus órgãos'. Ele se estendeu por terra. Ela acariciou seu pênis, que se tornou duas vezes maior, e deitou-se sobre ele. O homem experimentou um prazer enorme. Ele passou a seguir a mulher por toda parte, para voltar a fazer o mesmo, pois ela sabia mais coisas que ele, como acender o fogo, etc. Um dia, o homem disse à mulher: 'Eu quero te mostrar que eu também sei fazer coisas. Estende-te, e eu me deitarei sobre ti'. A mulher se deitou por terra, e o homem se pôs sobre ela. E ele sentiu o mesmo prazer. E disse então à mulher: 'Na fonte, és tu quem dominas; na casa, sou eu'. No espírito do homem são sempre estes últimos propósitos que contam, e desde então os homens gostam sempre de montar sobre as mulheres. Foi assim que eles se tornaram os primeiros e são eles que devem governar".

(Mito fundador do povo cabila - T. Yacine-Titouh, "Anthropologie de la peur")

Ilustre minha trajetória com beijos seus.

Linear:

Encontro- disputa de eixos/ entradas e saídas/ diálogos em tempo e ritmo dos micro movimentos.
Acaso - diagonal de pinos/ austrália (momento “certidão de óbito”)/ bandas/ cavalheiro/ célula Bel e Lila/ entrar para mudar a paisagem.
Relação - namorados/ “tá tudo bem” / equilíbrio da corda/ disputa de cabeças/ peso e contra-peso.
Exposição - cinderela até o beijo/ mapeamento da Nat/ lavagem/ retirada de roupa na árvore.
Tátil - austrália/ um cavalo sobre o outro.
Obsessão- falas simultâneas/ passagem de colos/ árvore com muita gente/ corrida coletiva/cinderela.
Corpo- lavagem vertical.
Construção - cavalo fragmentado/ árvore/ imagens congeladas/ entrar para mudar a paisagem/ início da célula Fred e Gunnar/ mapeamento da Lila.
Casal - namorados/ duplas de cavalos/ lavagem vertical/ diagonais de pinos/ disputa de eixos/peso e contra-peso.
Convívio -“tá tudo bem” / entradas e saídas/ micro movimentos/ rabo de cavalo.
Ascensão- cavalheiro/ árvore/ trote de três/ suspensões/ as montagens congeladas da célula Fred e Gunnar.
Dinheiro- corrida/ dancinha dos cavalos/ dancinha célula Cáca e Nat.
Vencedor- corrida/ trote com sorriso célula Cáca e Nat/ árvore/ alguém montado no cavalo em movimento.
Disputa- espacial/ lavagem/ touro/ disputa de cabeças/ início namorados/ movimento de tapa no chão/ falas simultâneas/ peitada Aline.
Dominação- passagem de colos/ árvore/ bandas/ cruzamento de trotes/ peso e contrapeso/ imagem final célula Bel e Lila/ célula Gunnar e Fred na disputa espacial.
Poder- touro/ lavagem/ disputa de cabeças.
Competição- briga célula Cáca e Nat/ bandas/ célula Fred e Gunnar/ passagem de cavalos por cima de outros/ cruzamento de trotes/ disputa de cabeças/touro/ corrida.
Abandono- quatro apoios alongados/ entradas e saídas/ corrida de um só/ rabo de cavalo.
Distância- pinos diagonais/ um cavalo alongado/ micro movimento Fred.
Desespero- corrida coletiva/ trote lateral/ touro/ quatro apoios com queda.
Carência- disputa de eixos/ lavagem vertical/ trote do peito do pé lento/ rabo de cavalo.
Quebra- cavalo fragmentado/ bandas/ queda frontal/ quatro apoios alongados.
Dor- touro/ quatro apoios alongados.
Ausência- imagens congeladas/ entradas e saídas.
Saudade- namorados/ rolamento/ “tá tudo bem” / célula Lila e Bel só com um.
Vazio- lavagem vertical/ entradas e saídas/ um pino com eixo deslocado/ micro movimento Lila.
Solidão- uma pessoa com quatro apoios alongados/ lavagem/ micro movimento Fred/corrida de um só.
Fracasso- quatro apoios/ movimento de tapa no chão/ quatro apoios com queda/ queda frontal/ aglomerado de corpos/ um cavalo sobre o outro.
Perda- passagem de colos/ entrar para mudar a paisagem/ micro movimento.
Falência- corrida coletiva/ quedas.

Não linear.

Casal: Construção.

Carência.
Corpo, Relação, Obsessão, Corpo, Relação, Obsessão.
Obsessão.
Disputa. Dinheiro
Dinheiro
Dinheiro.
Ascensão. Dinheiro
Dinheiro.

(Encontro)

Exposição, corpo, corpo, corpo, relação, corpo. Tátil
Ascensão.

.




Distância.



C
O
M
P O D E R, dordominação.
E
T
I
Ç
Ã
O





Ausência e Obsessão. Saudade.
Saudade, saudade, saudade, saudadesaudadesaudade.
Sau-da-de.
SAUDADE!

Desespero,quebra- dinheiro- solidão.

Perda.
Desespero,quebra- dinheiro- solidão.

Vazio.
Abandono, fracasso, falência. Dor
Acaso.

Como aquele disco novo que ainda nem foi aberto.

Como aquela meia velha que perdeu o par.

quinta-feira, 29 de março de 2012

e alguém me disse: você não tem escrito ultimamente.

e então pensei que não tenho mesmo. que deixei engavetado (mais uma vez) o projeto do livro que até ainda pouco rendia alguma distração. que sou um pouco viciada em missões impossíveis. que penso melhor quando estou no chuveiro, de preferência de cabeça baixa com a água quente queimando a nuca. que coloco o despertador pra mais cedo à toa, já que não levanto. que desperdiço tempo e pessoas por mera fixação no tempo (passado-futuro) e pessoas (outras). que estou cansada de ficar especulando, bom seria pôr as cartas na mesa. bom mesmo seria ter cartas na manga! que se o mundo acabar de fato em 2 anos, qual o sentido de investir em algo a longo prazo? qual o sentido de pensar nisso com seriedade? talvez pra sustentar uma conversa sem intimidade, algo como previsões do tempo... bem diferente do que ficou por dizer, bem diferente de já não dá mais pra ser assim. porque já não é assim mais. e pra provar que as coisas não vão nada bem, veio a sede e não tem água na geladeira...
.
.
.
Mas champanhe tem.

(Vanessa Pessoa)

"Homework"

Organização liner com a inclusão do repertório:

Dominação - corda; touro; comando de voz; banho; borralheira.

Poder - touro; corda; árvore; corrida em círculo; dança do Rafa; meia-rédia; coice.

Relação - namorados; deslocamento de eixo; banho; austrália; disputa de cabeça.

Tátil - banho; namorados; árvore; disputas; contrapeso.

Disputa - disputas; deslocamento de eixo; touro; trotes; escápulas; corrida em círculo; contrapeso.

Ausência - voz da Aline; quedas/rolamento; austrália; borralheira; jantar Belila.

Casal - rolamento; deslocamento de eixo; banho; touro; árvore; disputas.

Encontro - bandas; árvore; disputa de cabeças; contrapeso.

Perda - banho; quatro apoios; quedas/rolamento.

Corpo - banho; namorados; desarticulação do Gunnar; natação do Fred; dança do Rafa; trotes; coices.

Competição - disputas; trotes; touro; deslocamento de eixo; namorados.

Fracasso - quatro apoios; banho; bandas; desarticulação do Gunnar; borralheira.

Ascensão - árvore; trotes; corrida em círculos; jantar Belila; coice.

Distância - corda; jantar Belila; voz da Aline; banho.

Vazio - corrida em círculos da Cacá; austrália; dancinha do Rafa; borralheira.

Convívio - lavagem; namorados; jantar Belila

Acaso - banda

Falência - quatro apoios

Obsessão - corrida em círculos; borralheira; banho

Desespero - corrida em círculos; natação do Fred; touro

Dinheiro - corrida em círculos; trote

Abandono - autrália

Construção - árvore

Solidão - prólogo; quatro apoios; austrália; desarticulação do Gunnar; jantar Belila

Dor - borralheira

Exposição - composição Rafa e Aline

Saudade - austrália; deslocamento de eixo; borralheira

Carência - árvore; borralheira

Organização não liner:

Construção;

acaso encontro corpo relação tátil casal convívio obsessão obsessão obsessão dor.

Quebra;

vencedor poder dinheiro exposição ascensão competição dominação disputa disputa perda desespero disputa fracasso falência carência dor.

Ausência;

abandono saudade solidão solidão dor.

Vazio

Com crise, prostitutas de luxo se recusam a fazer sexo com banqueiros

GAROTAS DE PROGRAMA DE MADRI DIZEM QUE “GREVE” SÓ ACABARÁ QUANDO INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS OFERECEREM LINHAS DE CRÉDITO MAIORES PARA FAMÍLIAS CARENTES E EMPRESAS

Prostitutas de luxo de Madri estão decretando greve de sexo aos seus clientes banqueiros, reportou nesta terça-feira (27/03) o tablóide britânico Daily Mail. Elas pedem para que os funcionários das instituições financeiras abram linhas de crédito para oferecer a famílias carentes e empresas à beira da falência.

A Espanha enfrenta atualmente uma de suas piores crises econômicas, com as taxas de desemprego atingindo 23%. Com as incertezas sobre o mercado de trabalho e pouco dinheiro circulando no país, os bancos diminuem a oferta de crédito a seus clientes.

As garotas de programa dizem que a paralisação continuará até que os banqueiros “cumpram suas responsabilidades sociais” e comecem a oferecer empréstimos maiores à população. “Nós somos as únicas com capacidade real de pressionar o setor”, disse a principal associação de prostituição do país.

Segundo o tablóide, os banqueiros têm tentado contornar o protesto, dizendo que são arquitetos ou engenheiros às prostitutas, mas a tentativa não tem funcionado. Os executivos dos bancos até já acionaram o governo para tentar mediar o assunto.

Para a prostituta conhecida como AnaMG, a paralisação não deve durar muito. “Estamos em greve há três dias e eu não acho que eles agüentem mais tempo”, disse. Ela conta que a ideia veio de Lucia, uma das mulheres da associação, que disse que só faria sexo com o funcionário de um banco se ele concedesse um empréstimo a um conhecido.

A greve de sexo das prostitutas de Madri vem em um momento em que toda a Espanha se prepara para iniciar uma greve geral, marcada para esta quinta-feira. Os trabalhadores protestam contra o elevado grau de desemprego no país e pedem mudanças nas leis trabalhistas – que tornam mais barato para as empresas despedirem seus empregados.

http://epocanegocios.globo.com/Informacao/Acao/noticia/2012/03/com-crise-prostitutas-de-luxo-de-se-recusam-fazer-sexo-com-banqueiros.html

Paolo Cugini comenta a teoria sobre o "amor líquido" de Zygmunt Bauman


"Percebemos que novos atores estão passando no palanque da história, mas não conseguimos detectá-los, tão rápida é a passagem deles." FLUXO, MOVIMENTO LATERAL, PASSAGENS

"As preocupações mais intensas e obstinadas que assombram este tipo de vida são os temores de ser pego tirando uma soneca, não conseguir acompanhar a rapidez dos eventos, ficar para trás, deixar passar as datas de vencimento, ficar sobrecarregado de bens agora indesejáveis, perder o momento que pede mudança e mudar de rumo antes de tomar o caminho de volta (bauman, 2005b, p.9)." LINDO. Podia ser texto

"A sociedade líquida não desceu do céu, não se produziu do nada, improvisadamente, mas foi o fruto maduro do desmoronamento da modernidade, ou seja, do processo do derretimento dos sólidos formados e elaborados na modernidade." (Repare que Neon é um gás. O que dá o efeito fluorecente na luz é a retificação do ar líquido. POÉTICO! Nosso edifício em plongê, o prédio desabando, tá tudo ai.)

"No mundo fluido onde os valores são de natureza cambiante e as regras instáveis, o máximo que deve ser feito nos relacionamentos afetivos é reduzir riscos, evitar a perda de opções que se traduz na capacidade de terminar quando se deseje." (A forma de "amor"que tem aparecido nas composições)

“Como escapar à dor e a humilhação? A forma natural é matar ou humilhar seu algoz ou benfeitor. Ou encontrar outra pessoa mais fraca para triunfar sobre ela” (bauman, 2003, p. 110)." (A árvore, o touro, a derrubada)

“E os fluidos são assim chamados porque não conseguem manter uma forma por muito tempo e, ao menos que sejam derramados num recipiente apertado, continuam mudando de forma sob a influência até mesmo das menores forças” (bauman, 2005c p. 57)."

"Permanecer fixo, com uma identidade fixa, neste mundo rápido e fluido, não é aconselhável. A liquidez exige dos indivíduos a capacidade de não se deixar identificar. Quem é identificado, é perdido."


- Esses trechos foram destacados pela Susana! Eu e ela estamos estudando, ou melhor, tentando compreender a nova face de modernidade que estamos vivendo. O Bauman ainda fala sobre pós-modernidade. Outros teóricos, transgridem o termo e vão falar em hipermodernidade. Como se a "pós" nunca, de fato, tivesse existido. Ou seja, o que foi chamado de "pós" é hoje visto como uma passagem para a "hiper". Na hipermodernidade, os valores da modernidade são revistos, mas não ignorados. Uma outra face da modernidade se revela. Acreditamos que beber um pouco nessas teorias e teóricos maravilhosos possa ajudar a "compreender"  a trajetória temática que estamos vivenciando na construção deste espetáculo. Posto aqui no blog, pois esses trechos foram muito valiosos para eu me reapropriar dos materiais, buscando, sempre, uma nova visão e compreensão deles. Espero que também possa servir para vocês. Para clarear a mente e dar mais vibração ao corpo.

ps: as partes em negrito são comentários ou grifos da Su.
ps2: quem quiser ler o artigo completo, manda um email que a gente envia!

divirtam-se.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Eu parei para pensar nisso aqui #3


O palco esta nu. Frio. Um homem entra e se posiciona na baixa da direita. Ele inicia uma série de micro-movimentos. Mãos, braços, ombros, cabeça e quadril estão engajados em comunicar alguma coisa. O que ele quer dizer. Ou melhor, o que ele tenta dizer? A sua boca balbucia palavras inaudíveis. O movimento é gradativo. O homem dança e os meus olhos dançam com ele. Direita, esquerda, direita esquerda. Tudo é circular - é o que parece que ele quer me dizer. De repente, começa a se mover com mais velocidade e o seu corpo transpira. Me perco no corpo molhado deste homem e só o abandono quando, da alta direita do palco, uma mulher surge caminhando. Ela caminha tranquila e se dirige ao centro da alta do palco. De costas para mim ela já não se move mais. O homem continua a dançar, cada vez mais rápido, e a minha atenção se divide entre o corpo dele e a mulher. Ela começa a cantar. A voz é forte e a música é triste. Quero não entender. Mas é impossível. Imediatamente busco um sentido. Concluo: é um paradoxo. Me satisfaço. A relação entre os dois, aos poucos, se transforma em um só quadro para os meus olhos. Não existem mais detalhes. Me acalmo. De supetão, o homem desenraíza os seus pés do chão e em um brusco, porém leve movimento muda o seu corpo de direção. Já não me encara mais. Alívio. Ele traça uma linha reta da direita para a esquerda baixa, cruza com outro homem e pára. Nesse pequeno deslocamento mais outras duas mulheres já entraram no palco. Infelizmente não pude acompanhar suas entradas e só as noto agora. Até o momento são três mulheres e dois homens. Duas delas estão de costas. A outra está de frente. Um dos homens olha para a esquerda. O outro olha para frente. Todos estão parados menos o primeiro homem que continua a dançar. E suar. Ele traça, novamente, uma linha reta da esquerda baixa para a esquerda alta do palco. Durante mais este deslocamento, surgem mais uma, duas pessoas. Um homem que surge e desaparece, mais ou menos umas três vezes, e mais uma mulher que entra e fica parada, olhando para a esquerda. O último homem, finalmente, decide ficar. Na rebarba de sua última entrada ainda uma última mulher adentra o palco. No total são, agora, oito pessoas. Cinco mulheres e três homens. Duas estão de costas, uma olha para frente, a outra para a esquerda e a última para a direita. Dos homens, dois olham para a esquerda e o primeiro homem, o que dá origem a esta narrativa, continua a dançar. Seriam todos eles um só corpo? O homem que dança, dança por todos? Porque diabos ele se movimenta e de onde vem toda essa angústia? Angústia?


Só agora noto que uma placa, ABERTO, pendurada em uma vara do urdimento da caixa preta, mais ou menos na média do palco, está acesa. Quer dizer, ela foi acesa, mas também não pude acompanhar e, por isso, não posso dar certeza do momento em que mais essa pequena mudança ocorreu. O homem, o primeiro, o que dança, traça agora uma linha reta da esquerda alta para a direita alta do palco. Ele passa pelas outras pessoas como quem passa por árvores ou postes ou instituições. Na direita alta do palco, aos poucos, o homem vai parando de dançar. No seu corpo, vestígios de toda a sua movimentação ainda podem ser vistos. Direita, esquerda, esquerda, direita. Tudo é circular. A mulher, a primeira, a da canção tristonha, em algum momento também parou de cantar. O primeiro homem, que já não dança mais, observa quieto as pessoas. Começa a falar. Diz algo a respeito de um velho para o homem que cruzou com ele e que olha para a esquerda. Para uma das mulheres que está de costas ele fala sobre letras e medo. Facas e rodelas é são as palavras que sobram do que ele diz para a mulher que está de frente. Para o outro homem, aquele que surgiu e desapareceu antes de ficar de vez, ele diz alguma coisa sobre um refrigerante e um olho preto. Para a mulher que olha para a direita, conta de um cara que, outro dia, lhe tinha feito uma pergunta. Perguntou se aqui tinha chovido ontem - ele diz. Já para a que olha para a esquerda o assunto perpassa o envelhecimento de nossas línguas. Ele diz algo sobre ordem e mudança. Para a outra mulher que está de costas, a primeira a entrar e a mesma que cantava a triste canção ele diz: você me disse algo que eu não entendi, mas me lembro. 


É preciso dizer que durante a fala do primeiro homem todas as outras pessoas executam micro-movimentos. Todos eles diferentes. Parece também que tentam dizer alguma coisa, contribuir com alguma informação mesmo que desnecessária. São tentativas. Penso. Penso, onde estão todas essas pessoas? Que tipo de lugar é este sombrio e sem direção? Se olham para espacialidades diferentes, o que olham? Será que necessito dessa informação? É uma rede, arrisco, mais uma vez, buscando sentido para o que vejo. A placa de aberto... Estariam todos em café? Em um restaurante? Em uma tabacaria? Que tipo de estabelecimento é este? Será mesmo que eu preciso de uma ficção? Um café, por favor - diz a mulher que olha para a esquerda. Não. Me disseram que era aqui que eu precisava vir - diz a mulher que olha para a frente. Não. É  claro que eu compro uma revista para você - diz o último homem. Não. São realmente mais sete esquinas até a beira do mar? - pergunta a segunda mulher que parou de costas. Não. Eu trouxe a xerox dos meus documentos e me disseram que eu poderia ficar - anuncia o primeiro homem que parou, olhando para a direita. Não. A mulher que olha para esquerda direta: sexo é masculino ou feminino? Não. Eu fico feliz que você tenha conseguir vir...trouxe o que eu te pedi? - indaga a primeira mulher de costas. Não.

"Ficou olhando o quadro de Edward Hopper ali na sua frente, Night life e descobriu pasmada que nunca esse quadro teve tanta significação como nessa noite. O limpo e banal café de esquina de uma rua vazia de Nova York, o café quase vazio (só três pessoas no balcão) com o empregado de uniforme branco-azulado lavando coisas debaixo da torneira, xícaras? A longa fila dos banquinhos vazios contornando o balcão, tudo visto do lado de fora, através da comprida vitrine de vidro. O silêncio sem moscas. O vidro sem poeira.E esse quadro estranhíssimo de um café noturno em alguma esquina de algum beco em Nova York. Havia vermelho, mas nesse café até a cor vermelha era fria. A solidão medíocre." ( Lygia Fagundes Telles - As Horas Nuas)

Todos no mesmo lugar. Juntos, parecem não ter para onde ir. Que imagem buscar? De que cor pintar? Gesto, fala, tudo em um novo movimento? Como prosseguir sem, tão precocemente, ou não, desmanchar o quadro, a estrutura que, penso, é bonita. Para onde ir ou o que virá depois?

são tentativas.
prossigo.

William Forsythe - One flat thing reproduced 03/03

Tentativa.


Estatística

Se tem uma coisa que eu aprendi com a vida foi a nunca confiar em homens com uma cova no queixo: todos cafajestes! E Afonso, além da marca de volúpia, possuía um ar de bom moço e os sapatos muito bem engraxados. Totalmente suspeito. A combinação de suas características era tão inédita que em tudo argumentava contra os dados do meu estudo físico-comportamental do homem. Desde muito nova me ocupo em estabelecer associações entre a fisionomia de uma pessoa e seus traços de personalidade. Hoje, tenho uma longa lista que me possibilita formular expectativas a respeito do comportamento de qualquer indivíduo: é quase certa a avareza daqueles de nariz torto e o pessimismo dos de pé chato. Claro que nem sempre as estatísticas da lista são acertadas. Mas exceções não passam exceções.

Conheci Afonso no bar que costumo frequentar às sextas-feiras. Estava sozinha tomando um drink e ele se aproximou. Não disse nada. Permaneceu um bom tempo de pé e imóvel a menos de dois metros de minha mesa. Notei falhas tentativas de desviar seu olhar do meu. Por fim ele toma uma atitude: se dirige a mim e pergunta se eu aceito uma carona para casa. Achei um pouco ousado e precipitado da parte dele... Mas chovia muito e eu estava por demais interessada num estudo empírico daquela espécie tão estranhamente paradoxal; decidi aceitar a carona. Confesso que tive um pouco de medo. Afonso não me pareceu muito confiável... Sabe-se lá o que poderia fazer comigo. Mesmo assim acatei a minha intuição científica. Eu não podia deixar escapar uma possível exceção para a lista. E se ele estivesse mal intencionado, não seria de todo o mal... O rapaz era bem apessoado.

Ele me conduziu até seu carro e abriu a porta para que eu entrasse. Durante todo o caminho até minha casa ele nada disse. Apenas concordava com os comentários que eu me esforçava para fazer. Também em nenhum momento ele me olhou. Ao mesmo tempo que parecia extremamente concentrado na tarefa de dirigir, mostrava-se bem à vontade com um sorriso congelado em seu rosto. Eu já estava incomodada com todo aquele silêncio e num impulso que não pude domar, liguei o rádio. Afonso automaticamente iniciou um movimento vertical com a cabeça, tentando acompanhar o ritmo da música. Mas seu silêncio permaneceu; e meu incomodo evoluiu para a extrema angustia.

Chegando ao portão de minha casa, perguntei se ele não gostaria de entrar. Eu não podia deixar meu objeto de pesquisa ir embora!

- Deixa para uma próxima.

- Você vai me dispensar assim?

- Mas eu já te dei uma carona.

- Não me diga que era só isso que você queria.

- Sim.

- Você não me engana...

- Desculpe se me fiz entender mal. Mas agora eu realmente preciso ir.


No mesmo instante a mulher saltou da poltrona do carona para o meu colo. Tirou sua blusa e com ela amarrou meus braços. Ela me empurrou para fora do carro e me arrastou para dentro de sua casa. Com uma corda que havia no chão da sala, ela terminou de me imobilizar, prendendo minhas mãos aos meus pés e deixando-me assim de quatro. Num impulso predatório, a mulher montou em minhas costas:

- Você se considera uma pessoa extrovertida?

- Como?!

- Responde!

- Não muito...

- Você é tímido?

- Eu não estou entendendo...

- Responde!

- Às vezes...

- Praia ou montanha?

- Montanha?

- Por quê você me ofereceu uma carona?

- Porque você parecia sozinha e triste. Pensei que eu estaria ajudando...

Eu dei um tapa nele e em seguida o beijei.

- Esta seria a resposta correta.

- Eu lhe asseguro que não.

- Claro que não... Você não se contentaria com tão pouco. Sexo! Era isso que você queria. Sexo ocasional.

- Eu juro que não.

- Mentira!

Ela então voltou a me bater, porém dessa vez com tapas seguidos e com mão mais pesada. Eu já estava apavorado com aquela situação...

- Eu senti pena de você! Só isso! Pena da sua solidão!

- E por que ficou tanto tempo me olhando? Precisa de tanta coragem para oferecer uma carona?

- Talvez...

- Mentira!

- Então por que não estamos transando agora?

- Não! Não tente me enganar!

- E por que eu não posso só ter sido gentil com você?

- Porque você tem uma cova no queixo!


Uma exceção. Pior! A única exceção. Era unânime a cafajestagem dos de queixo marcado! Agora minha estatística iria de cem a noventa e nove por cento de casos! Eu não podia deixar isso acontecer... O único cem por cento da minha lista não podia ser simplesmente apagado!


- Peço desculpas se te decepcionei... Não é a primeira vez que minha cova ilude uma mulher. Mas agora que tudo já foi esclarecido; será que você poderia me desamarrar?

A mulher começou a bufar. O movimento de sua respiração repercutia como um chicote em sua coluna. Ela avançou em minha direção, e com a blusa que prendia minhas mãos, começou a me sufocar. Eu tentei gritar, tentei me soltar, mas aquela mulher estava possuída por força assustadoramente selvagem. Tentei resistir até o momento em que não pude mais. Caí morto no carpete da sala. No mesmo instante, lamentei não ter seguido a intuição que me dizia para não oferecer aquela carona... Se tem uma coisa que eu aprendi com a vida foi a nunca confiar em mulheres de lábios finos.